quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Passe adiante

“No mundo real, um favor é uma espécie de moeda de troca, mas o trabalho de Estudos Sociais de um menino da 7ª série chamado Trevor inverte essa lógica”

Quando chove nas férias não tem jeito, a melhor companhia é um bom filme. Como eu já previa que pudesse ocorrer de uma frente fria passar pela Serra, confisquei alguns exemplares da videoteca do meu namorado antes de pegar o rumo de Gramado para curtir uma semana de inverno com a família – em pleno verão.

Então, éramos nós quatro: minha mãe, eu, o chimarrão e o filme Corrente do bem, de Mimi Leder, com Kevin Spacey e Helen Hunt. Um filme propício, digamos, para uma semana em que os tremores de terra no Haiti não saíam da mídia.

No filme, um professor de Estudos Sociais desafia seus alunos da 7ª série a terem uma idéia que possa mudar o mundo. Brilhante! Esse mesmo professor deu um dicionário a cada aluno no primeiro dia de aula, para que eles procurassem o significado das palavras que não conheciam. E só a resposta dele à pergunta sarcástica de um dos alunos já teria valido as duas horas de filme:

- E o senhor, o que tem feito para mudar o mundo?

- Eu acordo cedo todos os dias e venho aqui dar aula para vocês.

Não precisava mais nada. Professores assim, que acreditam ser capazes de mudar o mundo apenas exercendo sua profissão conforme o juramento que fizeram no dia da formatura, estão em falta. Jornalistas também. A trama do filme se desenrola tendo a investigação jornalística como fio condutor. O repórter havia recebido um Jaguar como “favor” de um estranho que lhe mandou “passar adiante” e não sossegou enquanto não descobriu onde tinha começado aquela maluquice. No mundo real, um favor é uma espécie de moeda de troca. Faço algo a você e você fica eternamente grato, como se me devesse algo em retribuição.

O trabalho de Estudos Sociais de um menino da 7ª série chamado Trevor inverte essa lógica: eu te faço um favor e você paga a dívida fazendo favores a outras três pessoas que devem retribuir a gentileza a outras três pessoas e assim por diante. Bingo! É assim que se transforma o mundo, ajudando a melhorar o mundinho à nossa volta.

Olhando assim, parece simples demais, ou até mesmo insignificante essa idéia de ajudar três pessoas ao redor. Queremos fazer coisas grandiosas para mudar o mundo. Mas veja o filme e pense melhor.

Em tempos de tragédias como a do Haiti sobram voluntários cheios de boa vontade querendo fazer as malas e partir para salvar o mundo. Não percebem que têm essa chance todos os dias, ali mesmo, onde estão. Mudar o mundo está ao nosso alcance, como está para uma criança da 7ª série. Passe adiante.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Seguem os mitos em torno de Lost 6

No princípio era John Locke que aparecia ao centro, mas de costas no cartaz promocional de Lost 6. Depois, um tabuleiro de xadrez serviu como plano de fundo para o vídeo promocional da emissora Cuatro. Agora, o elenco posa para uma foto inspirada na Última Ceia, com Locke de novo ao centro, no assento de Jesus Cristo.


Em debate promovido dia 12 de janeiro, na Escola de Design da Unisinos, em Porto Alegre, Francisco Machado Pereira, André Conti Silva e Daniel Bittencourt discorreram sobre três aspectos que fazem de Lost um fenômeno midiático da atualidade: mitologia, roteiro e transmídia.

Lost está povoado de conhecidos mitos da humanidade, de diferentes épocas e crenças, entre as quais chamam atenção estátuas egípcias e personagens com nomes bíblicos – sem contar os que têm nomes de filósofos, como o próprio John Locke, Danielle Rousseau, Desmond Hume... há ainda a chuva que cai ou cessa em momentos cruciais da série, como lembrou Francisco no debate; a sugestão de que os sobreviventes foram “escolhidos” pela Ilha; e a eterna dúvida sobre que diabos é aquela Ilha, a que universo ela pertence – ou a que época, já que eles pulam no tempo o tempo todo.

A estrutura do roteiro contribui para reforçar o misticismo da série, pois os personagens recebem informações ao mesmo tempo que o público, nem antes nem depois. No debate, André comparou essa estrutura com a de uma telenovela: na novela das oito, em geral, ficamos sabendo que João é filho de José antes dos personagens e esperamos capítulo após capítulo para que essa revelação seja feita. Em Lost não. Nunca cogitamos a possibilidade de Jack ser irmão de Claire e caímos para trás quando eles descobrem, porque ficamos sabendo junto com eles. É o que esperamos para a temporada final, que começa dia 2 de fevereiro, pois há cinco temporadas Charlie lançou a dúvida: “Guys, where are we?”. Ele partiu sem saber a resposta, mas nós queremos saber.

Questionamento pertinente também levantou Daniel no debate: o que é Lost? Para ele, Lost não é apenas uma série de TV, os desdobramentos transmidiais da série estimulam a criação de novas narrativas, novas formas de consumo do produto midiático. Lost não se limita ao que passa na TV, seja por iniciativa dos produtores, ao lançarem cartazes sugestivos como este da ceia antes que a próxima temporada entre no ar, seja por iniciativa de fãs, que povoam blogs e sites de relacionamento apresentando sua teoria para o fim da trama.

E foi divagando sobre nossas teorias que saímos do evento até a parada de ônibus, no trajeto até a estação do trem e assim por diante. Mal podemos esperar pelo começo do fim, dia 2 de fevereiro.